O esquema que visava o pagamento de mensalidades para parlamentares votarem conforme as preferências do Poder Executivo completou 20 anos nesta sexta-feira (6).

Após mais de um ano de investigação, a Corte autorizou, em 2007, a abertura de processo criminal contra 40 acusados pela Procuradoria-Geral da República, tornando réu todos eles. Em novembro, foi instaurada a ação penal do caso.

Após 53 sessões, o Supremo concluiu o julgamento do mensalão, entendendo que houve um esquema de compra de votos durante os primeiros anos do governo de Lula.

Em 2012, o STF decidiu condenar 25 acusados, além de fixar as penas de cada um e cassar mandatos de três deputados federais.

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"Ruptura com a impunidade"

Para o Rubens Glezer, professor de graduação e mestrado da Escola de Direito da Fundação Getúlio Vargas em São Paulo (FGV), o julgamento do mensalão no STF "inseriu o Supremo na conversa ordinária".

"O julgamento leva quatro meses, então você tem capa de revista, análise no rádio, você a a ter também transmissões ao vivo do julgamento pelas emissoras de televisão. Esse era um assunto que entrou na conversa do cidadão do dia a dia. E o fato de que houve um certo drama, tinha uma certa dramaturgia nesse julgamento”, disse o professor à CNN.

"Você tinha ali um grau, não só de exposição, mas uma relação de mão dupla muito complexa, que inseriu o Supremo na conversa ordinária sobre política dentro da opinião pública, e como a política se tornou muito rotineira na vida do brasileiro de 2012 em diante, o Supremo também entrou”, prosseguiu.

Glezer destaca ainda que o mensalão mudou a ideia de que o foro privilegiado era sinônimo de impunidade na política.

"Então, tinha uma época ali que o foro privilegiado era um âmbito de impunidade para a elite política, e de alguma maneira, o mensalão muda isso. Ele a a ser um lugar de mais prejuízo pros réus do que de benefício. Então você tem, naquele primeiro momento, a ideia de que teve uma ruptura com a cultura de impunidade”, citou.

"Braço ativista do STF"

André Marsiglia, advogado e professor de Direito Constitucional, avalia que o julgamento do STF marcou a "visibilidade dos ministros e de aparições públicas como se celebridades fossem, sobretudo dos fatos dos votos serem televisionados e uma cobertura midiática muito forte. De lá pra cá isso tudo se naturalizou”.

O advogado defende também que o protagonismo do Supremo "auxiliou num braço ativista do STF, um ativismo judicial que nesse caso não foi bom para a autonomia dos Poderes, a meu ver".

"O ativismo judicial proporcionado pelo protagonismo tornou o STF cada vez mais, e hoje de forma definitiva, um poder político, um poder jurídico com efeitos políticos. Isso é nocivo para a autonomia dos Poderes, porque o STF, ao fazer a função política, ele absorve a função do próprio Legislativo, que tem por natureza a função de costuras políticas”, prosseguiu.

"Inédita punição de agentes políticos"

O STF já havia julgados casos emblemáticos antes do Mensalão, como a possibilidade de união homoafetiva, pesquisas com células-tronco embrionárias e cotas em universidades.

No entanto, André Luiz Maluf, procurador do Município de Juiz de Fora (MG), advogado e mestre em Direito Constitucional pela Universidade Federal Fluminense (UFF), relembra que foi com o Mensalão "que o Tribunal se projetou fortemente na arena política em razão da inédita punição de agentes políticos de alto escalão em uma verdadeira judicialização da política e de certa forma, ainda que de modo indesejado, uma politização da Justiça”.

"Independente das críticas, é evidente que o julgamento do Mensalão alçou o STF a um novo nível na arena política nacional e capitalizou o Tribunal para interferir em temas dos demais Poderes, sobretudo em casos de omissão inconstitucional”, finalizou.

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MensalãoSTF (Supremo Tribunal Federal)