Com o auxílio da plataforma Pinpoint, uma ferramenta de jornalismo desenvolvida pelo Google, a CNN analisou relatórios de fiscalização elaborados por órgãos como o Denasus, o Tribunal de Contas da União (TCU), a Controladoria-Geral da União (CGU) e o Ministério Público Federal (MPF).
A plataforma permitiu a compilação e a leitura ágil de dados reunidos ao longo dos anos que embasam as investigações e corroboram as denúncias, revelando práticas como a emissão de receitas falsas, a falsificação de cadastros de farmácias e a comercialização de medicamentos que deveriam ser distribuídos gratuitamente.
Servidores do Denasus revelam que a falta de estímulo e recursos adequados para fiscalização facilita a continuidade dessas fraudes, comprometendo o objetivo do Farmácia Popular de garantir o a medicamentos essenciais, gratuitamente ou a preços reduzidos.
Entre as irregularidades, a CNN verificou estabelecimentos que antes eram farmácias, mudaram as razões sociais e mesmo assim continuaram recebendo recursos federais pelo programa.
Apesar das fragilidades já apontadas pelos órgãos de controle e das recomendações de correção, as denúncias indicam que as medidas sugeridas não foram adotadas pelo Ministério da Saúde.
Em 2023, antes da expansão do programa, o Ministério Público Federal questionou se o Ministério havia tomado as providências necessárias para conter as irregularidades.
A CNN procurou o Ministério da Saúde sobre os temas abordados nesta matéria. Em nota, o Ministério disse que, desde a retomada do programa em 2023, “um dos principais focos foi corrigir fragilidades apontadas pelo Tribunal de Contas da União (TCU), pela Controladoria-Geral da União (CGU) e pelo Departamento Nacional de Auditoria do Sistema Único de Saúde (DenaSUS) na execução e controle do programa, além de combater indícios de fraudes.”
Na mesma nota, o órgão aponta que “em virtude das ações de monitoramento, de janeiro de 2023 a setembro de 2024, foram suspensas 1.238 farmácias por indícios ou notícias de irregularidades; no mesmo período, 363 farmácias foram descredenciadas por irregularidades. Esses dados demonstram o fortalecimento do controle e monitoramento, garantindo a integridade do programa. Em 2022, o número de descredenciamentos foi de apenas 28 unidades, com 30 multas aplicadas.” A íntegra da nota do Ministério da Saúde está no final da reportagem.
Uma auditoria realizada pela CGU, em abril de 2022, analisou 34.061 estabelecimentos credenciados no Farmácia Popular entre 2015 e 2020 e revelou um esquema de desvios que levou a um inquérito civil.
Segundo a investigação, esses estabelecimentos declararam vendas de medicamentos acima da realidade, gerando reembolsos indevidos por parte do governo federal, totalizando R$ 2,6 bilhões.
Em 2023, o TCU também sugeriu melhorias na gestão do Farmácia Popular após outra auditoria identificar falhas e vulnerabilidades no programa.
O ministro Vital do Rêgo, relator do processo, destacou a escassez de servidores para istrar e operacionalizar o programa, que conta com apenas um técnico do Ministério da Saúde na equipe.
Servidores do Sistema Único de Saúde (SUS) apontam que o fortalecimento da fiscalização seria uma solução para mitigar os desvios. No entanto, para os auditores o esvaziamento de equipes revela a necessidade urgente de renovação do quadro de fiscais.
Segundo os servidores, que preferem não falar por medo de represálias, a recuperação de recursos poderia ser maior se houvesse investimentos adequados na fiscalização.
Em 2023, o Denasus realizou 55 auditorias e analisou mais de 413 relatórios, envolvendo R$ 200 milhões em recursos. O resultado foi a recomendação de devolução de mais de R$ 40 milhões aplicados indevidamente.
Os auditores também relatam que o SUS carece de uma carreira específica de fiscalização, sendo o trabalho realizado por processos seletivos internos, o que, segundo eles, enfraquece as atividades de controle.
O Unasus Sindical discutiu com o Ministério da Saúde, em 2023, a criação de uma carreira dedicada à auditoria do SUS. Em resposta, o sindicato informou que as negociações continuam em andamento.
Especialistas em auditoria do SUS sugerem medidas preventivas para diminuir as fraudes no Farmácia Popular. Uma dessas estratégias envolve o uso da plataforma “Meu SUS Digital”, onde os cidadãos podem controlar a retirada de medicamentos em seu nome.
O vídeo informativo produzido pelo sindicato dos servidores da auditoria do SUS orienta como qualquer pessoa, com cadastro no “gov.br”, pode ativar ou desativar a autorização para retirada de medicamentos gratuitos, proporcionando mais segurança contra fraudes.
Nota - Ministério da Saúde
Em 2023, o Ministério da Saúde retomou o programa Farmácia Popular do Brasil, criado em 2004, após um período de desestruturação nos últimos anos. O programa retornou ampliado, mais inclusivo e com melhorias importantes. Um dos principais focos foi corrigir fragilidades apontadas pelo Tribunal de Contas da União (TCU), pela Controladoria-Geral da União (CGU) e pelo Departamento Nacional de Auditoria do Sistema Único de Saúde (DenaSUS) na execução e controle do programa, além de combater indícios de fraudes.
O Ministério da Saúde está atendendo a todas as determinações e recomendações dos órgãos de controle. A pasta avançou no aprimoramento dos sistemas de controle e auditoria, na digitalização dos processos de trabalho e no monitoramento do programa pela área técnica, garantindo maior segurança e eficiência à política. Em 2023, o DENASUS realizou 783 ações, incluindo auditorias e inspeções, identificando um montante de R$ 40,7 milhões para devolução aos cofres públicos.
O Farmácia Popular está em expansão, abrangendo mais municípios e beneficiários, com atendimento a 21,9 milhões de pessoas em 2023, representando um aumento de 8,8% em relação a 2022. Uma proposta para recomposição do quadro de servidores do DenaSUS foi enviada ao Ministério da Gestão e da Inovação em Serviços Públicos, e um processo seletivo interno está em andamento para ampliar a equipe.
Em virtude das ações de monitoramento, de janeiro de 2023 a setembro de 2024, foram suspensas 1.238 farmácias por indícios ou notícias de irregularidades; no mesmo período, 363 farmácias foram descredenciadas por irregularidades. Esses dados demonstram o fortalecimento do controle e monitoramento, garantindo a integridade do programa. Em 2022, o número de descredenciamentos foi de apenas 28 unidades, com 30 multas aplicadas.